Preservando a Memória
“Pouco se sabe no Brasil, nos meios adventistas, sobre a disseminação da mensagem entre nosso povo. Pouco ou quase nada um membro da igreja pode relatar sobre a época em que a tríplice mensagem [referência a Apocalipse 14:6-10] raiou no Brasil, através do porto de Itajaí, em Santa Catarina. A triste realidade é que a igreja não teve meios para conservar sua memória histórica...” (Ivan Schmidt, José Amador dos Reis – Pastor e Pioneiro, p. 9). Enquanto pensava no tipo de projeto final que eu deveria fazer para alcançar o grau de bacharel em Jornalismo, concluindo assim os quatro anos de faculdade na Universidade Federal de Santa Catarina, deparei-me com o texto citado acima. “E por que não?” – disse para mim mesmo – “Por que não fazer uma reportagem sobre o início da obra da Igreja Adventista do Sétimo Dia no Brasil?”
Naquele momento, escolhi meu projeto. Os seis meses seguintes foram dedicados à pesquisa sobre pessoas e fatos que fizeram história no meio adventista mas que, infelizmente, em boa parte foram esquecidos.
Nos primeiros dois capítulos deste livro, fiz uma breve introdução de como teve início a história da Igreja Adventista no mundo. Em seguida, procurei contextualizar a chegada da mensagem no processo da colonização alemã no Vale do Itajaí-Mirim – berço do adventismo no Brasil. Para isso, tive de gastar bom tempo em pesquisas sobre o assunto, principalmente no Museu Histórico do Vale do Itajaí-Mirim, em Brusque.
Como os fatos relatados (referentes à chegada do adventismo ao Brasil) ocorreram há mais de um século e, como já disse, poucos são os registros sobre eles, tive de contar principalmente com informações obtidas nas entrevistas com os parentes dos pioneiros – a maioria netos e bisnetos – e com os raros livros e artigos publicados em revistas denominacionais.
Passei horas agradáveis entrevistando pessoas e rememorando situações inspiradoras. Tive o prazer de caminhar por lugares históricos. Conheci a casa onde ficava o armazém de Davi Hort, local onde foi aberto o primeiro pacote de literatura adventista; o rio onde foram batizados os primeiros conversos; a primeira igreja adventista do sétimo dia no Brasil, no bucólico vale de Gaspar Alto; o púlpito de onde foram pregados os primeiros sermões no pequeno templo; a casa-dormitório dos estudantes da primeira Escola Missionária Adventista do Brasil e os cemitérios da Esperança (em Gaspar Alto, SC) e dos Pioneiros (na Fazenda Passos, RS), onde estão sepultados os pioneiros do movimento adventista.
Coletadas as informações, a questão agora era: Como escrever sobre tudo isso? Que estilo usar? Um texto bíblico do profeta Habacuque me deu a idéia. Ele, que viveu cerca de 600 anos antes de Cristo, conhecia as técnicas modernas de escrever melhor do que muitas pessoas, hoje: “Vou subir a minha torre de vigia e vou esperar com atenção o que Deus vai dizer e como vai responder à minha queixa. E o Deus Eterno disse: ‘Escreva em tábuas a visão que você vai ter, escreva com clareza o que vou lhe mostrar, para que possa ser lido com facilidade’” (Hb 2:1, 2).
O profeta se colocou num ponto estratégico: na torre de vigia. Um local onde, ao mesmo tempo em que se mantinha próximo a Deus, podia observar o que acontecia ao seu redor, o que falava o povo, quais as tendências sociais da época, para onde ia o rei...
“Para que possa ser lido com facilidade.” “Prender” o leitor o tempo suficiente para ler nossa mensagem é realmente um desafio. Era no tempo de Habacuque e é muito mais em nosso mundo agitado. Por isso, o escritor deve mobilizar recursos que envolvam o leitor e o façam prosseguir na leitura.
Como o simples relato cronológico dos eventos seria monótono, utilizei recursos próprios da literatura, como reconstituição de cenas e diálogos. Afinal, “em termos modernos, a literatura e o jornalismo são vasos comunicantes, são formas diferentes de um mesmo processo”, diz o crítico Boris Schnaiderman, citado no livro Páginas Ampliadas – O Livro Reportagem como Extensão do Jornalismo e da Literatura, p. 139.
No mesmo livro, à página 142, o autor Edvaldo Pereira Lima, jornalista, escritor e pesquisador, diz que “os norte-americanos aplicam o termo jornalismo literário para designar a narrativa jornalística que emprega recursos literários. Os espanhóis a denominam de periodismo informativo de creación. Esse emprego é necessário porque, para alcançar poder de mobilização do leitor e de retenção da leitura por sua parte, a narrativa de profundidade deve possuir qualidade literária”.
Apesar de o público alvo deste trabalho serem os membros da Igreja Adventista do Sétimo Dia, pensei também nos possíveis leitores que não pertencem à igreja. Assim, encontraremos, por exemplo, um casal de alemães em Brusque “lendo” sobre a segunda vinda de Cristo e Roberto Fuckner “demonstrando” à esposa o porquê de ter-se decidido pela observância do quarto mandamento – o sábado – como dia sagrado.
Embora tenha procurado ser imparcial ao narrar os eventos – como deve procurar fazer todo jornalista –, admito que exalto com apaixonado entusiasmo a obra e os feitos realizados pelos pioneiros do movimento adventista. O leitor saberá compreender que o livro foi escrito por alguém que pertence ao movimento e defende sua filosofia e, por isso mesmo, não pretende divorciar-se de seus valores para atingir uma impossível perspectiva neutra.
Finalmente, os agradecimentos. Seria impossível mencionar todas as pessoas que, de forma direta ou indireta, contribuíram para que este trabalho fosse desenvolvido. Mesmo assim, não poderia deixar de agradecer às senhoras Paulina Gohr e Neli Bruns, a Augusto Alfredo Fuckner, Hilza Fuckner, Clara B. Hort, Henrique Carlos Kaercher e Herta Hort Kaercher, Marta Hort Rocha e Diomar Donato da Rocha, Eliseu Calson e Iria Calson (bondoso casal que me hospedou enquanto coletava dados em Gaspar Alto), Arnoldo Schirmer e Edith Belz Schirmer, Helmut Schirmer, Evaldo Belz (neto de Guilherme Belz), Edegardo Max Wuttke (o incansável pesquisador) e pastor Cláudio Belz (bisnetos de Guilherme Belz, que me franquearam seus arquivos de família e partilharam singelas recordações), Otto Kuchenbecker (responsável pelo Museu Histórico do Vale do Itajaí-Mirim, que me concedeu acesso aos arquivos do museu), Olinda Hort Schmitt, pastor Ivo Pieper (distrital de Jaraguá do Sul, na época), pastor José M. de Miranda (então distrital de Brusque) e sua esposa Rosemarie (por todo auxílio prestado na obtenção de informações na região de Brusque), Erich Olm (advogado da Divisão Sul-Americana) e ao seu pai Germano Willy Olm (neto de Augusto Olm, o primeiro ancião da IASD, no Brasil), aos pastores Wilson Sarli (ex-diretor da Casa Publicadora Brasileira) e José Silvestre (diretor de Jovens da Associação Paulistana), ao Arquivo Histórico de Itajaí. Agradeço, também, à professora e jornalista Neila Bianchin pelo acompanhamento e orientação na elaboração deste trabalho e ao professor e jornalista Dr. Nilson Lage pela copidescagem do texto original. Mas, sobretudo, agradeço ao Criador por me conceder o privilégio de lidar com assunto tão inspirador. Cresci muito com este projeto e passei a sentir ainda mais “orgulho” da fé que professo – o que espero transmitir a você, leitor.
Esta reportagem resumida e adaptada ao blog (lançada integralmente em forma de livro pela Casa Publicadora Brasileira, em 2000, com o título A Chegada do Adventismo ao Brasil) não é um apanhado de biografias. É antes a “biografia” de uma mensagem que transpõe barreiras étnicas e geográficas; atravessa o tempo e alcança pessoas de diversas idades e culturas (alcançou-me em 1989). Uma mensagem de esperança que tem o poder de transformar vidas, mudar corações. Uma mensagem que, segundo Manoel Margarido, ex-diretor de colportagem da União Sul-Brasileira da IASD, “está voando celeremente nas asas aurifulgentes da página impressa, deixando um rastro luminoso de [pessoas] esclarecidas. O seu vôo ... será ininterrupto, até que a mensagem resplandeça com grande poder em todo o mundo” (Revista Mensal, abril de 1930, p. 2).
Meu sincero desejo é que este livro possa ser uma justa homenagem aos homens e mulheres que dedicaram a vida para estabelecer a obra adventista no Brasil. Ao mesmo tempo, espero alcançar uma classe muito especial da igreja: os jovens. Que esta leitura possa inspirá-los com o exemplo dos bravos pioneiros que não mediram esforços ao lutar por aquilo em que acreditavam.
Michelson Borges
Tatuí, março de 2000
Sumário
Capítulo 1 • O Grande Desapontamento
Capítulo 2 • O Avanço da Mensagem
Capítulo 3 • Em Terras Tupiniquins
Capítulo 4 • Recebendo a Mensagem
Capítulo 5 • Como Folhas de Outono
Capítulo 6 • Os Primeiros Conversos
Capítulo 7 • O Dia do Senhor
Capítulo 8 • Um Exemplo de Fé
Capítulo 9 • Das Colonias Alemãs para o Brasil
Capítulo 10 • A Passos Largos
Desenvolvimento cronológico resumido
1824 – Início da imigração alemã para o Brasil.
1884 – O pacote contendo dez revistas A Voz da Verdade, em alemão, chega a Brusque, SC.
1890 – Surgem os primeiros observadores do sábado em Gaspar Alto, SC. Guilherme Belz é o pioneiro.
1893 – Albert B. Stauffer, primeiro missionário enviado ao Brasil pela Associação Geral, chega em São Paulo.
1894 – (1) Albert Bachmeier encontra observadores do sábado em Brusque e em Gaspar Alto; (2) William H. Thurston chega ao Rio de janeiro com dois caixotes de livros, estabelecendo naquela cidade um depósito de livros.
1895 – (1) Pastor Frank H. Westphal chega ao Rio de janeiro em fevereiro. Acompanhado por Stauffer, inicia uma viagem realizando batismos em São Paulo e terminando com a cerimônia batismal de Gaspar Alto, em junho; (2) em junho, a primeira igreja adventista do Brasil é organizada em Gaspar Alto; (3) no mês de julho, os irmãos Berger chegam ao Brasil para colportar; (4) pastor Huldreich F. Graf chega ao Brasil em agosto e, em dezembro, realiza o batismo em Santa Maria do Jetibá, no Espírito Santo; (5) é criada a Missão Brasileira da IASD.
1896 – (1) Pastor Frederick Spies chega ao Brasil e batiza 19 pessoas em Teófilo Otoni, MG; (2) em julho começa a funcionar o Colégio Internacional de Curitiba, PR, a primeira escola particular adventista.
1898 – Começa a funcionar a escola paroquial de Gaspar Alto, sob a direção de Guilherme Stein Jr.
1900 – (1) Além da escola paroquial já existente em Gaspar Alto, tem início o curso superior, sob a direção do pastor John Lipke; (2) começa a ser publicada a revista O Arauto da Verdade, em português, mas ainda em tipografia secular. Guilherme Stein Jr. foi seu primeiro editor.
1903 – Em agosto, o Colégio Superior de Gaspar Alto é transferido para Taquari, RS. A escola paroquial da igreja de Gaspar Alto, entretanto, continuou funcionando.
1904 – (1) O pastor Ernesto Schwantes visita o comerciante José Lourenço Mendes, em Santo Antônio da Patrulha, RS. Surgem as igrejas de Campestre e Rolante e inicia-se a transição do adventismo das colônias alemãs para todo o Brasil; (2) pastor Lipke consegue, nos EUA, a doação de um prelo para o Brasil.
1905 – O prelo é montado no colégio de Taquari, RS. A Sociedade Internacional de Tratados no Brasil (embrião da Casa Publicadora Brasileira) inicia suas atividades gráficas.
1907 – A Casa Publicadora Brasileira (então conhecida como Tipografia Adventista de Taquari) é transferida de Taquari para São Bernardo do Campo, São Paulo.
1911 – (1) José Amador dos Reis, da Igreja de Rolante, ingressa na colportagem, passando depois à obra bíblica, na qual foi ordenado ao ministério, tornando-se o primeiro pastor adventista ordenado no Brasil (em 1920); (2) é organizada a União Brasileira, com sete campos, 68 igrejas e 1.550 membros.
1915 – É fundado o Colégio Adventista Brasileiro, em São Paulo (hoje Unasp, campus São Paulo).
1931 – No vasto Amazonas, a lancha médico-missionária Luzeiro I, pilotada pelo pastor Leo B. Halliwell, inicia grande trabalho filantrópico na região.
1943 – O programa A Voz da Profecia começa a ser irradiado através de 17 emissoras, sob a direção do pastor Roberto Rabello.
Epílogo - A tocha vai passando
“Há 70 anos, nossos pais receberam, no Brasil, de uma maneira providencial e com miraculosas evidências divinas, esta mensagem do advento. Não a receberam como prêmio ou privilégio particular, mas para que fosse comunicada a todos os habitantes do Brasil, bem como a todo o mundo.
“Nós, os filhos, ouvimos as vozes de nossos pais proclamando a breve volta de Jesus em glória. Ouvimos da graça salvadora; da necessidade de observar a lei da família de Deus; de estarmos atentos e preparados para o dia da volta do Rei dos reis.
“Vimos os sinais deste último século. O aumento da ciência; perversão e revolta no lar e na sociedade. Passamos por guerras e ouvimos rumores de guerras. Lemos dos terremotos e das coisas espantosas que aconteciam.
“Vivemos num mundo de injustiças, mas estamos no caminho de um em que ‘habita a justiça’. Estamos envoltos na mais negra escuridão do pecado, mas já vislumbramos o arrebol de um novo dia.
“Sentimos o aproximar do último combate espiritual. O tempo avança e nossas forças diminuem. Nossos passos são mais lentos, inseguros; nosso respirar é mais ofegante; nossa alma fica apreensiva e anelante. Olhamos preocupados para o negror das carregadas nuvens e a fúria da tempestade e, como outros, perguntamos: ‘Guarda, a que hora estamos da noite?’ (Isa. 21:11). E ‘até quando durará... a transgressão assoladora...’ (Dan. 8:13).
“Lemos da resposta do Santo e compreendemos que já estamos há 126 anos no ‘tempo do fim’. O nosso trabalho deveria ter terminado, mas a fraqueza e a mornidez humana fazem prolongar a dor e o sofrimento, e adiar a restauração, na vinda de Jesus Cristo.
“Nesta emergência, Deus ainda indaga: ‘Quem há de ir por nós?’ O silêncio que segue a uma tão importante pergunta é interrompido pelo grito de milhares de jovens, exclamando: ‘Eis-nos aqui!’ É a voz da juventude que se levanta. É a resposta a Deus e a nós. [São eles] que continuarão a tarefa que nós deixamos e pela qual demos nossas forças, que agora fraquejam.
“Vós continuareis o trabalho que nós deixamos. Vós ainda sois fortes.
“Não temereis a procela, porque vosso olhar está fixo em Jesus.
“Não vos assustareis com o rugir do ‘leão’, que tem pouco tempo, pois tendes a arma de dois gumes, que é ‘mais penetrante do que espada alguma’.
“Não vos assombrareis diante do crepitar da fogueira, acendida por línguas mal controladas, porque aprendestes a perdoar.
“Não vos acovardareis ante a besta de sete cabeças e dez chifres, nem com a sua imagem que vos proibirá ‘comprar ou vender’, porque no Cordeiro está a vitória.
"Não vos espantareis com a pobreza, entregando tudo o que tendes ao Mestre, porque ‘o seu pão lhe será dado, as suas águas serão certas’.
“Não desanimareis ante ameaças mil, pois tendes um lema: ‘O Evangelho a todo mundo nesta geração’, com o grandioso incentivo: ‘O amor de Cristo nos constrange’.
“Meus jovens, nós cremos em vocês. Nós sabemos que seguireis a trilha dos jovens que, em todas as épocas, lutaram sob as ordens de Deus.
“Nós sabemos que sereis fiéis aos vossos superiores e à vossa pátria.
“Nós temos a certeza de que fareis coisas maiores do que aqueles que vos antecederam.
“Por isso, nós confiamos a vós a ‘tocha da fé adventista’ que nos foi entregue pelos nossos pais, e estamos tranqüilos, pois sabemos que esta mocidade nunca trairá o seu Mestre e nem o seu torrão natal.”
(Mensagem proferida pelo pastor Rodolpho Belz [27/07/1898 – 12/01/1978], neto do pioneiro Guilherme Belz, no 2º Congresso Sul-Americano da Igreja Adventista do Sétimo Dia, realizado nos dias 19 a 22 de janeiro de 1970, em Curitiba.)
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Deus sempre teve Seu povo fiel em todos os tempos. Durante a longa noite de trevas espirituais da Idade Média, manteve Seus fiéis guardadores da chama da Verdade.
Os Valdenses, organizados por Pedro Valdo em 1173, foram os guardiões dessa “chama sagrada”. Opondo-se aos erros e tradições da igreja oficial e seguindo fielmente as Escrituras Sagradas, atraíram sobre si as maiores perseguições. Chegaram a ser excomungados pelo Papa, em 1181. Foram obrigados a dispersarem-se por todo o continente europeu, estabelecendo-se, a partir do século 13, nos Vales do Piemonte.
Ali, naqueles vales, os jovens valdenses estudavam e se preparavam copiando grandes porções das Escrituras. Depois, saíam a espalhá-las nas cidades e nos campos. “Dos que se preparavam para serem ministros exigia-se um estágio de três anos colportando [do francês colporteur, que significa levar ao pescoço, devido ao costume dos valdenses de levar os escritos sagrados debaixo da roupa ou numa bolsa que pendia do pescoço].”[1]
Disfarçados de comerciantes, esses jovens misturavam-se ao povo em busca de interessados na Palavra de Deus. Quando encontravam algum, tiravam debaixo da roupa alguma porção das Escrituras, liam, explicavam e vendiam. “Dessa maneira, esse exército de jovens motivados pelo maior dos ideais, a cruz de Cristo, e liderados pelo próprio Jesus, preparou o solo de onde brotaria a semente da Reforma cristã do século XVI.”[2]
Muitos séculos antes, outros jovens também se destacaram pela coragem e fidelidade a Deus. Foram Daniel e seus amigos hebreus. Cativos na pagã Babilônia, esses hebreus foram submetidos a muitas provas. “Daniel foi submetido às mais severas tentações que podem assaltar os jovens de hoje; contudo, foi leal para com a instrução religiosa recebida na infância. Ele estava cercado por influências que subverteriam aqueles que vacilassem entre o princípio e a inclinação; todavia, a Palavra de Deus o apresenta como um caráter irrepreensível... Ele fazia de Deus a sua força e o temor do Senhor estava continuamente diante dele em todos os acontecimentos de sua vida.”[3]
Certo dia, o rei Nabucodonosor convoca todo o seu reino para reverenciar uma grande estátua de ouro. Diante da majestosa imagem todos se prostram e adoram-na. Todavia, em meio à multidão, três pessoas se destacam, pois permanecem em pé: Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, os amigos de Daniel. Severamente repreendidos, os três jovens são lembrados pelo rei que, se não se prostrarem, serão jogados numa fornalha ardente. A resposta dos três é clara: “Fica sabendo, ó rei, que não serviremos a teus deuses nem adoraremos a estátua de ouro que levantaste” (Dn 3:18). Que coragem! Que fé! “Esses três hebreus possuíam genuína santificação. O verdadeiro princípio cristão não pára a fim de pesar as conseqüências. Não pergunta: ‘Que pensará o povo se eu fizer isto?’ ou ‘Quanto afetará meus planos, se eu fizer aquilo?’ Com o mais intenso anseio os filhos de Deus desejam saber o que Ele quer que façam, para que suas obras O glorifiquem.”[4]
No século 19, outros jovens se destacaram igualmente por sua coragem. Tiago White começou a pregar o segundo advento em 1842, com a idade de 21 anos; John N. Andrews iniciou a carreira de pregador aos 14 anos e, aos 21, já era um profícuo escritor; John Loughborough era conhecido como o “pregador adolescente”, aos 17 anos; Uriah Smith, aos 21 anos, foi indicado para ser o redator da Editora Adventista nos Estados Unidos; Ellen G. White iniciou seu ministério aos 17 anos, e por mais de 70 dedicou-se a pregar. Ellen, na ocasião de seu chamado por Deus, tinha apenas o terceiro ano primário e era uma jovem muito frágil, devido às doenças e dificuldades pelas quais havia passado na infância. Mas não olhou para suas limitações, e sim para o que poderia fazer por Deus, pois “o Senhor não chama apenas os capacitados, mas é fiel em capacitar aos que chama”.
Diante disso tudo, tenho certeza de que Deus tem grandes planos para a juventude adventista brasileira (tem grandes planos para você, também!). Assim como usou os pioneiros deste movimento para dar início à proclamação da mensagem de advertência ao mundo, Ele quer usar você e a mim para pôr fim à Obra, a fim de que Cristo possa logo voltar.
Em uma de minhas pesquisas em Gaspar Alto (em 1995), tive a oportunidade de conhecer o “Cemitério da Esperança”. Lá, enquanto caminhava por entre os túmulos dos pioneiros, um hino me veio à mente:
"Quanta emoção, prazer nos traz
Só o lembrar a antiga fé
Que inspirou os nossos pais
Ante a dor e a morte até."
Muitos pioneiros da obra adventista no Brasil estão enterrados naquele cemitério. Ao lado do túmulo do pastor Gustavo Storch existe um outro com a placa: “O Pioneiro”. É o túmulo de Guilherme Belz (1835 – 11/03/1912). Fico, então, imaginando o dia maravilhoso da volta de Cristo, quando essas valorosas pessoas forem chamadas de volta à vida e tomarem conhecimento do quanto seu trabalho frutificou e que seu esforço não foi “vão no Senhor” (1Co 15:58).
É claro que de nada adiantaria falar de homens e mulheres que colocaram a vida nas mãos de Deus e tudo fizeram por Sua obra, se isso não nos fizesse ver que essa missão está agora sobre nossos ombros. Precisamos compreender a sagrada responsabilidade que temos por adotar o nome de adventistas do sétimo dia e termos, agora, a “tocha da verdade” em nossas mãos.
Essa bela história continua sendo escrita por nós. Avancemos com fé, confiantes de que “o Deus de Israel ainda está guiando o Seu povo, e continuará com eles até o fim”.[5] E aguardemos a “bem aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Senhor Jesus Cristo” (Tt 2:13). Amém!
Fiz esse desenho em 1999, para ilustrar meu livro A Chegada do Adventismo ao Brasil, lançado pela Casa Publicadora Brasileira em 2000. Nele, procurei representar os principais momentos da história do adventismo no Brasil: a chegada do pacote de revistas A Voz da Verdade a bordo de um navio; o casarão comercial de Brusque, onde o pacote foi aberto em 1884; o bêbado Dressler espalhando folhetos e revistas pela região da Colônia de Brusque; Guilherme Belz tendo contato com a mensagem adventista e comparando o conteúdo dos livros e folhetos com sua Bíblia; e o batismo de Guilherme Stein Jr., nas águas do rio Piracicaba, em 1895.
Referências:
1. Chaij, Nicolas. O Colportor de Êxito, Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, quarta edição, 1992, p. 25.
2. Reis, Denilson dos. “Como Tochas Ardentes”, Revista Adventista, julho/93, p. 35.
3. White, Ellen G. Santificação, Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, sétima edição, 1988, p. 21, 22.
4. Idem, p.43.
5. White, Ellen G. Testemunhos Seletos, Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, quinta edição, 1985, v. 3, p. 439.